sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Tudos

Química poesia mar
Bar rua lugar morada
Bola desejo música
Medo sonho criação
Dança veludo olhar
País pais paz
Calendário horas finitude
Tormentos falas lembranças
Imagens cores muralhas
Margens gavetas risos
Migalhas prazeres camurça
Sol luar lugar
Solavanco susto surpresa
Miragem montanha andar
Frases contos cantar
A palavra canta suas dores
E sofre quando não dita
A palavra sorrir seus amores
Beijados durante o dia
A palavra pessoa de carne e osso
Abandonada nesse alvoroço
A palavra pessoa distante
Enormemente empoeirada
Perdida no diariamente
Pessoa sem palavra
Desapalavrada sem correção
Migrada de um lado a outro
Sem direção
Palavra comprada comparada
Sem aparência ondulação
Palavras papoulas ou rosadas
De tons sem sugestão
Palavra santíssima em oração
Oráculo de inspiração
Palavra desumanizada de gesto
Despoetizada palavrão
Agruras minadas desilusão
Palavras permanentes deusificadas
Imortalizadas pela criação
Palavra cadenciada
Filmada em baixa rotação
Ação da palavra contramão
Barulhenta sonora cega
Embolada misturada iniciada
Pela miscigenação.

( Dja Vasconcelos)

Independente

Hoje é sete de setembro
Do ano que não importa
É dia velado
Pelos não-encorpados
De verdade e alforria.
Uma pátria faz de conta
Que é um dia feliz,
Um dia de glória
Um dia como país.
Os sem país, olham o 7
Não entendem a graça
Não comemoram nada
Além de um dia a menos
O vão da pátria é uma casa vazia,
Um lugar que não esconde,
Um beco sem esquina,
Onde pede quem tem fome.
Era sete de setembro
No reinado do faz de conta
Era tarde ou muito cedo?
Não importa, isso não muda!
Muda fica a palavra utopia
A palavra sonho, esperança,
Alegria.
Estado sem memória, esquizofrênico.
Portador das mentiras, mazelas!
Terreno da construção inversa
Terra pendurada num varal inconsciente
Varal queimado ao sol,
Sol, que a alguns bronzeia
Dourando a pele, os pêlos, os sonhos
Outros queimam no mesmo sol
Dourando apenas a dor.
De onde vem toda essa água?
Para que mar ela corre?
Se o mar dos flagelados é seco.
É o mar da rua, o mar da solidão,
O mar do desespero,
um mar sem comunhão.
Senhores, o que querem das ruas?
Felicidade, alegria, beleza?
A rua é triste, senhores!
Só há asfalto e violação
E suas noites, frias ou quentes,
Permanecem inertes, escutando:
Os zumbidos dos insetos noturnos,
Os cachorros que ladram,
As sirenes que denunciam a violência...
São essas as companhias
De quem não tem o sete
Como um dia de festa.

(Dja Vasconcelos)

Miolo

O cabaço do juízo
Tem forma incomum
É um olho sem pestana
Com pernas no finito
Pisando no teto do nada

Um lençol no deserto
Vazado pelo sonho
É clandestinamente falado
Até o olhar sair do oculto


Lubrificantes garras
O hímen dá desejo
Falos perfurantes
Da vistas a outro mundo
E o juízo se descabaça

A cabeça posta em outro prato
Com novos sabores
Novos talheres
Mesa nova, inova
Forrada com caminhos
Desiguais e variáveis
Frutifica o juízo
E o cabaço é outrora

( Dja Vasconcelos)

PESSOA

O poeta está dentro do corpo
O corpo está no quarto
Na casa
Que está na cidade
A cidade está dentro do poeta
Possuidor de vários corpos
Em outras cidades
Outras moradas
Dentro do corpo
O poeta exorcizado de si

(Dja Vasconcelos)

Marcas

Quem é essa solidão que me come?
Quem trouxe ela à minha casa?
Anjos, duendes, piedades, louvação?
Qual o seu nome ou sobrenome?
Qual sua meada para comigo?
Calo os lamentos de forma franzina!
Abraço o ventilador da memória
Cuspo contra o tempo estático
Tropeço nas cavidades cardíacas
Não espero a aurora resplandecer
E ir embora lentamente
Como uma vontade imprópria
O herói tem fome de coragem
Esquiva-se da armadilha noturna
Das casas escuras, dos becos sem nada
A feroz tristeza ignora o lamento mudo
Refaz a palavra solidão como quem louva
Não, solidão, não me acompanhe!
Não me peça guarida para dormir
Pois eu não durmo.
Sou assim:
Acusado de temer o vazio,
De temer amanhecer sozinho,
De temer a noite que assisti passear,
Junto com a víbora mesquinha, sozinha,
Com a borboleta louca
Embriagada pela luz artificial
Do herói, só há covardia e silêncio
Não tem casa, sobrenome, nem fome
É só reflexo do que lhe consome.

( Dja Vasconcelos)

domingo, 26 de dezembro de 2010

Escuro

A Sombra do papel na parede
Escurece o caminho da formiga
Que, tateia a saída,
Organizada em fila indiana.
Caminha no mesmo sentido das demais.

A sombra do papel na parede
Dá abrigo à víbora
Na espreita, a vítima é questão de tempo.
A ingênua borboleta:
Sem fila indiana, sozinha, procura a luz
Antes, pousa na parede
É vítima da sua solidão.

Eu, tu, ele, víbora e borboleta!
O verbo é singular, sozinho.
A víbora não tem critério
A borboleta não vê a luz
Nós, vós, eles, formigas.
Que não desatinam,
Mesmo quando o papel esconde a luz

(DJA vASCONCELOS)

AQUI E DEPOIS

A sua idade não é essa
Não existe
Não demore tanto pra nascer
O seu tempo foi excluído
No dia da morte ser

Suas unhas postiças
Diferem da sua mão
Diferentes são os dedos,
Os dentes e a conclusão

A comunhão separou
Tudo o que restou
Da moeda em queda
Da queda involuntária
Das marcas sozinhas
Naquele dia do mês
Um mês, um ano...

E o que há de novo
É a discussão sobre
A imagem
Imagens rápidas
Como as informações.

Sucinto navegar
À uma procura tranqüila
Um beijo, uma música,
Uma mão.

Pois, tua idade é o eu
A espera da morte
Num vão

(Dja Vasconcelos)

domingo, 5 de dezembro de 2010

Transpiração

Havia um papel e um cinzeiro
O meu olhar não encontrava
Nem uma poesia no papel ou
No barro
O eu absoluto se desvaira
Nas letras que não se juntavam
Os símbolos perdiam significados
E o meu olho trancava-se na
Matéria sem vida, inanimada.
Ao meu socorro veio a interrogação
Que não completava a falta
De miscigenação do verbo
A boca seca sentia um travor de sorriso
E o depois era uma espera infinita
Do carma que me proponho.

Não há carnaval nem gloria
No suor que escorre outrora
Da mesma face que não chora.
Aqui tardo a dormir
Envocando o que me dê forma
Ou deforma
Eis, poesia, o morto que espera vida!

(Dja Vasconcelos)

Desvestida

Hoje as horas se atropelam
Nos dias, semanas, anos...
Gente passou a ser ser
Essa singularidade é prova da
Distância humana

A vida ávida de calor
Também
Foi At----ro===PEL:::::adA
Por máquinas frias
Tela de computador, ponteiro dos segundos,
centésimos, milésimos...

Nos anos-luz do nosso vazio
Aglomeramos medos e tristezas
Na era das incertezas
De formas labirínticas
Equivalente ao que estamos esperando

Mortal e fria é a pegada uníssona
Dos diferentes caminhos seguidos
Por corpos de isolamento, lamento
essa risada sozinha,lamento
essa procura sozinha, lamento
essa tristeza sozinha, lamento
esse tropeço sozinho, lamento
esse lamento sozinho, lamento...

( Dja Vasconcelos)

ASSIMETRIA

Minha poesia é cega
Nada avista
quando as paralelas se tocam
Ela não quer certezas
Tateia todos os caminhos
possíveis
quer ser perdida
desencontrada
Minha poesia é debilitada
de mentiras
não quer gracejos ornamentais
Prefere a palavra vulgar
-como vulgo de si mesma-
Ter uivos indolentes
e sumir ante a vergonha
de estar só para o deleite
Minha poesia é árida com a fé
de semblante cáustico
Se refaz por necessidade
Aposta no desigual
como forma de questioná-lo
É mordaz com a vaidade
e singular quando vida
Poesia, enquadra o mundo
em ti e ensina o respirar
gradativo
Permita a fuga para o depois.

( Dja Vasconcelos)